Por Ismar Capistrano C. Filho
Dezenas de mortos, centenas de
feridos e milhares ofendidos. Esse é o saldo de mais uma publicação de um
veículo ocidental agressiva ao Islamismo. Os desrespeitos ao fundador da
religião, no filme “A inocência do Muçulmanismo” do diretor estadunidense Alan
Roberts, foram suficientes não só para causar a ira, os distúrbios e a violência,
mas para fazer-nos refletir sobre o papel social da liberdade de expressão.
Afinal esta garantia é um meio e um fim da vida social? Há critérios para seu
exercício?
Compreender isoladamente a
liberdade de expressão leva-nos a distorções que só podem ser evitadas ao
articularmos outros valores sociais que contextualizam este direito. A
possibilidade de expressar-nos livremente constitui um garantia fundamental à
visibilidade. Para participarmos de uma sociedade, nossas ideias, opiniões e
informações precisam circular. Não há exclusão mais cruel do que a aplicada com
o desprezo e a invisibilidade. Todavia, a visibilidade é insuficiente para viabilizar
nosso convívio social. Podemos ser vistos e sermos desconsiderados,
menosprezados e até discriminados. Por isso, a liberdade de expressão precisa
caminhar para além. Necessitamos construir tolerâncias que possibilitem sermos
expostos e compartilharmos mutuamente nossas existências. Assim, estamos
seguindo rumo não só mais à visibilidade, mas ao direito à comunicação, baseado
nas relações mútuas, na qual a expressão deve estar subordinada, sob risco
tornar-se socialmente inconsequente.
A tolerância, entretanto, não
garante o respeito mútuo. Podemos tolerar e, ao mesmo tempo, praticarmos a descriminação
e marginalização, acentuando injustiças e dificultando a vida social. Só superamos
os preconceitos, quando reconhecemos a legitimidade dos diferentes,
possibilitando o direito a identidade coletiva de todos os grupos e a equânime expressão
de todos. Para isso, a organização de nossas sociedades deve acolher a
diversidade como normal, tornando a ausência de padrões nosso padrão social. A
convivência entre os diferentes demanda a prática do constante diálogo que
possa levar a fusão de horizontes, compreendido como uma constante troca e tradução
das diferenças.
A liberdade de expressão abrange,
desta maneira, não só uma garantia procedimental de poder inconsequentemente expressar
o que quisermos, mas um valor substantivo. Vivencia-la significa não
simplesmente a possibilidade de ser visível, mas de, reciprocamente, ser
respeitado, tolerado e reconhecido. Só assim, liberdade de expressão reflete a
consideração que necessitamos para participarmos da coletividade. Torna-se
desta maneira meio e fim de nossa mútua existência social, garantindo a
comunicação como a constante trocas e intercâmbios dos inevitáveis conflitos de
nossa diversidade.
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