Minha
sobrecarga durante a investigação doutoral faz com que alguns autores
permaneçam anos na minha fila de espera para lê-los. Dentre estes Deleuze,
Gatarri, Elias e o francês Brunol Latour, que se destaca não só por
estar constantemente circulando nas discussões sobre comunicação, redes,
internet e tecnologias, mas por meus pré-conceitos a sua ideia de inteligência artificial
e às apresentações sobre sua teoria.
O último
contato com as ideias latoursianas foi na palestra do Prof. Dr. André Lemos da
Universidade Federal da Bahia (UFBA), um dos principais pesquisadores
brasileiros de Cibercultura, durante a Semana de Abertura do semestre do
Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG) em 25 de março de 2015.
Três
questões me incomodaram em sua fala. Primeiro, a ideia de imunidade de Latour
às políticas epistemológicas porque sua teoria não estaria inserida na lógica
de disputas acadêmicas, mas pertenceria a lógica de agregar conhecimentos. O
questionamento me foi inevitável: seria possível a construção de uma teoria ou
epistemologia fora dos conflitos e articulações dos grupos que criam ou se
inserem os pesquisadores na construção teórico-metodológica¿ Essa pretensa
imunidade não serviria para encobrir uma posição política e epistemológica da
ingênua crença nos consensos?
Outra
questão que me incomodou foi a forma como Lemos apresentou a ideia de
diversidade dos conhecimentos para Latour, afirmando que, por exemplo, as
ciências não teriam chaves de leitura para entender a dança da chuva, dado que
iria ridiculariza-la por sua ineficácia no estímulo às precipitações. De qual
ciência está se falando? Do utilitarismo científico do século XVIII? Talvez neste
caso a afirmação pudesse ser aceitável, no entanto as ciências possuem sim, atualmente,
chaves de leituras para relacionar-se com essas diversidades de representações,
discursos e vivências sobre o real.
O
interpretativismo da antropologia cultural de Clifford Geertz, por exemplo,
procura relacionar-se com essa diversidade, compreendendo a partir da descrição
densa os valores culturais dos grupos como próprios de sua expressão e
adaptação ao ambiente, às construções simbólicas, à história e à política.
Assim nesta perspectiva, a dança da chuva é uma valiosa manifestação, rica de
signos que revelam o grupo cultural, as relações sociais e as disputas de
poder.
Por fim, senti outro incômodo com a utilização
do conceito de mediações como sinônimo de tradução e preposição. Ora, mediações
não são abreviações de intermediações, que até poderiam ser interpretadas assim
e nessa perspectiva, os dissensos e disputas inevitáveis nas relações humanas
seriam obscurecidos. Mediações são deslocamentos. São práticas culturais.
Assim, imprescindivelmente diversas, conflitivas e agonísticas. Creio que nesta
abordagem, a epistemologia da comunicação poderia ser melhor contextualizada em
sua condição de historicidade e a diversidade das ciências compreendidas.
Principais livros de Bruno Latour: Jamais fomos modernos e Enquête sur les modes d'existence.
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